viver sozinho

é difícil falar sobre até onde podemos ir por causas erradas. é difícil falar sobre viver sozinho. o próprio conceito é complicado. vivo rodeada por olhares soturnos e cerrados quando perguntam se eu tenho namorado e eu digo um sonoro “não”. vivo rodeada por falas isoladas que tornam a minha vida solitária em um quase crime. o viver sozinho é dificilmente visto com bons olhos. eu já liguei muito pra isso. muito mesmo. a ponto de encarar um namoro que nunca foi namoro. a ponto de reservar toda a minha agenda para alguém que eu sequer gostava. sim. eu cheguei a este ponto. e, sim, eu sei que foi o fundo do poço. já chorei um bocado por ter descoberto esta triste verdade sobre mim mesma. mas já aceitei tudo e comecei a arar a terra desse poço e dar um jeito de dar uma iluminada nessa confusão toda.

o bom da vida é que os buracos em que entramos podem ser transformar em portas. robustas portas que se abrem para novas possibilidades. e é só por isso que eu deixo no lixo, todos os dias, o saco de pão que eu deveria enfiar na minha cabeça antes de sair de casa. até a tal da esperança voltou pra minha vida tamanho é esse buraco aí. este fundo do poço me mostrou que há quase dois anos não me apaixono. e eu tô falando é de paixão de verdade. pensar em alguém e sentir-se bem com isso. coração batendo quando vê aquele par de olhos na sua frente. mão gelada no jantar do primeiro encontro. e por aí vai. o problema é que eu não aceitava uma vida sem paixão. sem um menino pra gostar. uma boca pra beijar. e quando perdi o grande amor da minha vida, me vi em completo desespero, pronta pra inventar amores por aí. criar histórias de livros infanto-juvenis. cenas de filmes que adoramos. frases que passam como carrossel pela nossa cabeça. inventei. e eu passei muito tempo desse jeito e paguei um preço alto por isso.

mas que bom que existe um tipo de amor que salva a gente desses apuros, né? é o amor próprio. há dois meses eu peguei minhas mãos e acolhi o meu coração, tão esmagado pelas minhas atitudes, tão perdido em meio a tanta ilusão, tão descolorido porque a tinta da canetinha vermelha acabou faz tempo… e é esse amor que está me ensinando, a cada dia, a enxergar novos amores pela minha vida. amores como meus sobrinhos. meus pais. amigos e livros. chás e cinema. diários e travesseiros fofos. ensinando a viver sozinha porque eu preciso, de uma vez por todas, saber quem eu sou e quem eu quero ser desde 2012. a verdade é que quando o meu grande amor se foi eu não parei pra pensar a respeito. fui vivendo uma vida de miscelâneas, de bagunças. é como se eu sentisse um milhão de sentimentos desconexos com desconhecidos e, quando sozinha, não sentisse nenhum. nada. passava meus dias entorpecida. passei dois anos sem a minha essência. vivendo uma vida que não era minha. achando que sabia o que queria. quem era. quem serei. e por aí vai. eu me estraguei um tiquinho. eu me anulei um tantão. eu não soube cuidar de mim. a aventura começa quando a gente se propõe a viver sozinho. e viver sozinho é coisa séria. que todo mundo deveria saber fazer. o conceito de viver sozinho transcende o “gente sem namorado”. quem tem um namorado também precisa saber viver sozinho. porque aprender a viver sozinho é sozinho por ser livre. livre das correntes do passado. livre dos medos do futuro. pronto para, finalmente, viver o único dia que temos: este.

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♪ para ouvir lendo ● heroes – david bowie